segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Pureza: não tão pura assim...

Ocupação intensa da área da fonte assusta ambientalistas em Pureza*

O que mais chamou a atenção dos participantes do comboio que a Trilhamiga levou ontem a conhecer as nascentes do rio Maxaranguape foi a utilização intensa da principal delas, a fonte de Pureza, por visitantes.

“É um piscinão de Ramos que não se concebe naturalmente em lugar nenhum do mundo”, advertiu o engenheiro agrônomo Marco Antonio Dantas, presidente do Comitê Hidrográfico da Bacia do Pitimbú (CHB-Pitimbú), que os jipeiros levaram às nascentes do Maxaranguape para ver como pode contribuir para ajudar a sociedade civil da região a se organizar através de uma entidade semelhante à que lidera na região metropolitana potiguar.

Esta foi a terceira expedição a nascentes de rios potiguares em que a Trilhamiga contou com a colaboração de Marco Antonio. Ele tem exercido papel decisivo na busca de eficácia para as missões em que a Trilhamiga levou observadores a conhecer as nascentes do Pitimbú, situadas em Macaíba. Preso a compromissos agendados muito anteriormente, ele não pode participar da expedição que a Trilhamiga promoveu, alguns meses atrás, às nascentes do Potengí, em Cerro Corá.



FORMIGUEIRO HUMANO

A alusão a uma grande piscina que o poder público implantou anos atrás no subúrbio de Ramos, no Rio de Janeiro, terminou sendo adotada pela maioria dos participantes da caravana que levou “off roaders”, ambientalistas e autoridades e técnicos governamentais a visitarem ontem Pureza e o município de João Câmara, onde se situa a primeira nascente do Maxaranguape, um olheiro sazonal situado em algum ponto da localidade de “Buraco Seco” que será melhor identificado durante o inverno. Moradores da área instados pela caravana souberam indicar o curso do riacho que dá início ao Maxaranguape, mas não conseguiram identificar onde ele começa.

Impressionando-se com o verdadeiro formigueiro humano em que a fonte de Pureza se transforma nos fins de semana, o presidente do Instituto de Gestão de Águas do Rio Grande do Norte (Igarn), engenheiro Celso Veiga, mostrou, durante a visita de ontem, que o peso imposto pela presença de muita gente sobre as rochas em que a água aflora com muita força já provocou alguns pequenos acidentes geológicos. São visíveis os sintomas de quebra da rocha. Além disto, a água não se resignou quando o poder público encheu o espaço da fonte com alvenaria e concreto. Ela abre frestas nas calçadas e volta a se manifestar num espetáculo que maravilha os observadores.



CAPTAÇÃO POR FORA

Em defesa da utilização do local como grande atração turística ressaltou duas realidades. A primeira é a de que, prudentemente, muitos anos atrás, quando resolveu captar água da fonte para abastecer as populações de várias cidades do Mato Grande, a Companhia de Águas e Esgotos (Caern) teve o cuidado de implantar um sistema de captação autônomo em relação à água que chega à superfície da fonte e faz a alegria dos banhistas.

De fato, como ressalva o hidro-geólogo Marcelo Queiroz, gerente do setor de hidrogeologia da Caern, que também integrou o comboio, a convite da Trilhamiga, a central de captação situa-se vários metros ao lado da fonte natural, e a empresa capta o líquido destinado à distribuição em João Câmara e outras cidades num ponto subterrâneo que não tem o menor contato nem recebe nada da água encontrada na superfície.

Em segundo lugar, de alguns anos para cá a prefeitura de Pureza tem investido muito na tentativa de manter limpa a fonte. Isto se observa principalmente na área em que os banhistas mergulham na fonte natural, propriamente dita. Na grande piscina situada ao lado e ligada à fonte por cavernas em visitantes atravessam em mergulhos perigosos, nem sempre se pode falar em limpeza. Seria injustiça, porém, considerar suja a água no espaço em que a fonte se irresigna contra as tentativas de seu aprisionamento pelo homem: embora centenas de pessoas utilizassem o tanque natural e espaços acima, a água em que os turistas tomavam banho parecia límpida aos olhos dos integrantes do comboio organizado pela Trilhamiga. Os visitantes podiam ver até os pés dos adultos que estavam na posição vertical enquanto tomavam banho, e ninguém via na água qualquer resto de embalagem plástica ou outro detrito deletério. Em pontos estratégicos da duna, cartazes afixados pela prefeitura apresenta varias recomendações quanto à limpeza e preservação ambiental da nascente.



Embora a beleza destas águas seja inegável, também é um fato o desgaste que ela sofre pelo uso escessivo e abusivo pela qual se destina. Talvez tal situação possa ser controlada, ou mesmo contornada, com a implantação de uma política de conscientização da população que dela se beneficia, bem como de uma maior atividade de proteção ambiental, na captação de lixo, por exemplo.


Ninguém pode negar, a um cidadão trabalhador, o direito de entreter-se e de relaxar, banhando-se em águas cristalinas e divertindo-se com seus pares, contudo, é um mal do ser humano aproveitar dos recursos que o mundo lhe oferta ao mesmo tempo que se esquece, ou mesmo desconsidera, que tais recursos não são infinitos. Para utilizar sempre, é preciso saber utilizar corretamente.


O que de longe encanta, muitas vezes, de perto espanta. As águas de Pureza já não são mais tão puras... Como diz o ditado, nem tudo que reluz é ouro e, convenhamos, mesmo o outro pode perder o seu brilho e o seu valor, se não for preservado.



(*) o trecho em azul fora extraído, na íntegra, do "Notícias de Jipeiros", edição N° 585/2007 de segunda-feira, 10 de dezembro de 2007.